Uma das maiores dificuldades para profissionais que atuam na área de comércio exterior é entender e lidar com as diferenças culturais entre a parte brasileira e sua contrapartida estrangeira, sendo um comprador ou fornecedor.
A diferença cultural, um termo amplamente usado, vai além de diferenças linguísticas, ela engloba a percepção de todos os aspectos da vida cotidiana, diferenças de entendimento sobre o que é aceitável e o que não é. Para ajudar a amenizar as dificuldades impostas por essa barreira, a equipe da Lantau traz no artigo de hoje algumas características gerais dos chineses no âmbito dos negócios.
Vale lembrar que esse é um assunto subjetivo, sem aplicabilidade universal, e reflete apenas a experiência empírica da Lantau nos anos de experiência acumulada pela nossa equipe.
1 - Pragmatismo
Tanto do ponto de vista de resolução de problemas como no processo de tomada de decisão, o empresário chinês tem uma tendência de priorizar ações que resultem em resultados concretos e que possam ser facilmente mensurados, geralmente demonstrando pouca dificuldade em fazer alterações no plano anteriormente determinado.
O conceito da curva de aprendizagem é muito forte aqui, ou seja, a ideia de que o modelo só será atingido por meio de várias tentativas seguidas de correções e não por extensos e complexos planejamentos e projeções.
O exemplo mais evidente dessa característica é a facilidade que muitas fábricas chinesas têm de fazer customizações e outras modificações nos produtos para atender demandas específicas de clientes. Embora parte dessa disposição seja proveniente da elevada concorrência no complexo ambiente de negócios do país, existe uma característica cultural por trás que aqui estamos chamando de pragmatismo, ou seja, a capacidade de focar única e exclusivamente no problema em questão e fazer de tudo para resolvê-lo.
Seja objetivo, tenha suas exigências bem definidas e passe ponto a ponto com o seu fornecedor para confirmar se ele tem ou não capacidade de atender o que você está buscando. Também tenha claro para si que, no caso de surgirem erros ou problemas nos produtos, eles poderão ser corrigidos e devem ser encarados como espaços de melhoria e desenvolvimento naturais da relação sua com seu fornecedor
2 - Foco no curto prazo em estágios iniciais
Ao negociar com fornecedores ou parceiros chineses, discursos e palavras valem muito menos do que ações e resultados. Embora isso possa parecer verdade para pessoas em geral, e não apenas para o empresário chinês, o pragmatismo dos chineses, já abordado no item 1, faz com que discursos sobre o potencial futuro da relação tenham menos apelo do que uma nova ordem de compra ou um novo pedido assinado e confirmado.
Isso é especialmente verdadeiro para negociações com fornecedores chineses, que recebem pedidos de cotação dos mais diversos cantos do planeta todos os dias. Isso desgasta e os torna mais céticos e pragmáticos na hora de atender os clientes. Aqui, é importante que, antes de serem feitas um grande número de exigências ou a utilização de métodos mais agressivo na negociação do preço das mercadorias, se mostre alguma resultado concreto, fechando um primeiro pedido, mesmo que em menores quantidades, demonstrando a seriedade do comprador com relação a nova parceria recém estabelecida.
Uma vez criada e estabilizada a relação entre comprador e fornecedor é possível negociar qualquer coisa, desde preço até prazos de pagamento, fator fundamental no Brasil e normalmente de difícil flexibilização pelo lado chinês.
3 - Desconfiança
Outra consequência das frequentes e, em sua maioria, infrutíferas comunicações e sondagens de cotações, é uma certa desconfiança dos fornecedores chineses sobre novos compradores, estrangeiros ou chineses.
Embora isso hoje esteja mudando, historicamente a China nunca teve um sólido sistema jurídico que garantisse a validade e concretude de contratos formais assinados por duas partes.
Uma das características em comum que países geralmente classificados como ‘ocidentais’ possuem é a noção de leis como regras claras e absolutas, além das instituições do poder judiciário que garantem que as regras serão cumpridas, ou seja, no caso de uma das partes descumprir o que estava firmado em contrato, é possível que a parte prejudicada abra um processo contra a parte infratora e, mediante apresentação do contrato assinado, receba sua compensação, portanto, o poder que emana de um contrato não vem do documento em si, mas sim do sistema jurídico por trás que garantirá seu cumprimento.
Ao trazermos essa noção para um ambiente que não tenha um sistema jurídico robusto, é possível afirmar que um contrato, mesmo que assinado, não passe de um pedaço de papel. Essa foi a realidade da China durante a maioria de sua história.
A forma que os chineses encontraram para contornar essa dificuldade foi a construção da confiança via relacionamentos pessoais, uma característica também muito presente no Brasil, mas por motivos diferentes. É importante que sejam feitas visitas à fábrica do fornecedor, que os compradores apareçam por lá em pessoa, que ambas as partes se conheçam e se conectem. Isso cria confiança que por sua vez traz boa vontade para aceitação de exigências que seriam normalmente negadas no caso de um comprador aleatório por parte do fornecedor.
Conclusão
Para finalizar, é importante que o comprador tenha claras suas exigências e aborde as questões fundamentais para desenvolvimento do negócio de forma objetiva. As exigências sendo validadas, o essencial é que sejam tomadas ações para demonstração da real intenção de concretização do negócio rapidamente, a melhor delas sendo a compra de um primeiro pedido, mesmo que em menor quantidade para testes.
Uma cultura diferente da brasileira, sem dúvidas, mas também com alguns pontos em comum. Para os interessados em comprar e desenvolver relacionamentos com parceiros de negócios chineses, mesmo que na posição de comprador, é importante entender como funciona a dinâmica e as regras não aparentes do maior parque industrial do mundo.
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