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Lítio, a corrida pelo ouro branco: A chave para o Futuro da China e do Mundo

Atualizado: 10 de set.


Entre 1848 e 1852, aproximadamente 300 mil pessoas migraram para o estado da California, nos Estados Unidos. Vindos de outras partes do país, esses trabalhadores cobiçavam as jazidas de ouro recém-descobertas na região por John Sutter, na cidade de Sacramento.

O mercado do ouro saturou e sua importância relativa caiu nos quase dois séculos seguintes. Do ouro, passamos ao petróleo, na era dos carros elétricos e energias renováveis, para o lítio.

 

A CADEIA DO LÍTIO.


O minério de símbolo ‘Li’ na tabela periódica, é o principal componente na fabricação de baterias, hoje usadas nos produtos eletrônicos já muito presentes no dia-a-dia de todos, de celulares a carros elétricos. Sendo o metal com maior mobilidade elétrica, e mais alta densidade de armazenagem de eletricidade, é o candidato ideal para as demandas por energia no século XXI e sua importância no processo produtivo dos veículos elétricos (VEs), somado a demanda criada pelas políticas chinesas por energias renováveis e alternativas, colocaram o lítio no centro do tabuleiro geopolítico chinês.

Apenas em 2023, a China importou mais de 4 milhões de toneladas de lítio refinado, um aumento de 41% em comparação com o ano anterior, representando cerca de 63% do total das importações globais. Por trás das movimentações desse mercado estão os grandes atores chineses, geralmente desconhecidos, como a Ganfeng Lithium, que aumentou seu controle, em maio de 2024, sobre um dos maiores projetos de mineração no oeste da África. Pelo montante divulgado de $342,7 milhões, a gigante chinesa ampliou sua participação em um projeto de mineração de lítio de grande escala no Mali, conhecido como Goulamina.

Mas de onde vem todo esse lítio? Para entender como a China busca e estabelece suas fontes de lítio, é necessário domínio de conhecimentos básicos sobre seu processo produtivo. O lítio pode ser obtido de duas fontes: salmouras e minérios brutos. Considerando ambas as fontes do minério, a China possui 13% das reservas totais mundiais, de acordo com a United States Geological Survey (USGS), mas segue sendo a maior importadora de lítio. Isso ocorre, pois as reservas chinesas estão dispersas por seu território e apresentam baixa qualidade, acarretando uma deficiência no fornecimento doméstico, que não consegue atender a demanda nacional, forçando então os chineses a buscar alternativas no exterior.

Das principais fontes de lítio no âmbito global, Austrália, Argentina, Chile e China são os grandes nomes do momento, todos com atuação em ambas as fontes de extração do lítio. Embora já importante compradora de todos esses países, a instabilidade no cenário geopolítico e uma constante diretriz com enfoque na segurança do fornecimento, vem incentivando as empresas chinesas a diversificarem sua rede de fornecedores, como demonstrado pelo projeto chinês no Mali.

 

USO E DESAFIOS


Uma vez extraído e refinado, 71% deste lítio é utilizado na fabricação de baterias e uma ampla gama de produtos eletrônicos, especialmente os VEs. Com marcas já mundialmente conhecidas, o mercado de VEs na China disparou desde 2020, dobrando o número de vendas entre 2020 e 2021 para 6,6 milhões de veículos e para 8,1 milhões em 2023, segundo a Environment Energy Leader.

A indústria, porém, não se desenvolve sem desafios. A produção de lítio sofre ataques sobre seus impactos causados ao meio ambiente: o lítio proveniente de fontes minerais tem alta demanda por energia, cuja geração produz e emite gases de efeito estufa (GEE). Estima-se que para cada tonelada de lítio refinado vindo de fontes minerais, sejam emitidas 15 toneladas de CO2 para a atmosfera. O lítio produzido das salmouras também gera problemas, com um consumo excessivo de água (469 metros cúbicos para cada tonelada de lítio), riscos de contaminação aos mananciais e lixo tóxico resultante do processo produtivo.

Do ponto de vista ambiental, a extração do lítio dificilmente pode ser considerada “verde”, mas a tendência de aumento chinês nesse campo não deve desacelerar, e o motivo é político: além da demanda por novas fontes de energias, indústrias de alta tecnologia, especialmente os VEs, já se tornaram símbolos do desenvolvimento chinês, que é efetivamente notável. A presença de empresas como BYD nos mercados americano e europeu veio para ficar, mas os desafios seguem.

Como conciliar a demanda crescente  por um minério que depende de fontes estrangeiras de fornecimento e a autossuficiência tão enfatizada pelo governo chinês nos últimos anos? Incapacidade da produção doméstica de satisfazer a demanda do país gera dependência de fornecimento estrangeiro, que aumenta a vulnerabilidade percebida de indústrias consideradas chave para o desenvolvimento da China no futuro.

Soma-se a isso desafios de ordem técnica, como ainda incipiente tecnologia de reciclagem para baterias usadas, que potencialmente reduziria a necessidade de importações de matéria prima, assim como o aprimoramento de tecnologias de extração em altas altitudes e em salmouras de baixa concentração, características das reservas domésticas chinesas.

             

CONCLUSÃO


No país onde mercado e política são indissociáveis, as grandes oportunidades estão nas deficiências das indústrias prioritárias para o governo, e para a China como um todo. Tecnologias para aprimoramento de extração do lítio ou reciclagem de baterias, novas fontes do minério ou melhorias em qualquer elo dessa cadeia tendem a receber maior atenção e incentivos.

O Brasil, com suas grandes reservas e tradição na indústria da mineração, tem o potencial de surfar essa onda, estabelecendo parceria com instituições chinesas para aumentar a produtividade das suas jazidas, potencialmente desenvolvendo tecnologias de possível aplicação na própria produção chinesa, e transferindo tecnologia às empresas e ao mercado doméstico chinês.

A corrida pelo lítio não vai parar e as deficiências e necessidades de hoje não possuem natureza perpétua. Com investimentos constantes nas áreas denominadas como prioritárias, a China não poupa esforços para resolver sozinha suas próprias deficiências e dificuldades, entretanto, há espaço para aqueles que puderem, e souberem, se posicionar.


 

Referências:







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